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    Petition of Right [Dicionário Global]

    A Petition of Right (1628) integra o conjunto dos valiosíssimos diplomas legais germinados no calor revolucionário do século XVII, na Inglaterra.

    Como muito bem refere Patrícia Jerónimo, “os direitos foram trazidos pelas revoluções” (JERÓNIMO, 2015, 64). Nos primórdios da Idade Moderna, os ingleses foram pioneiros no trilhar do caminho em direção à limitação da soberania monárquica e ao fortalecimento dos direitos individuais.

    Uma das grandes conquistas alcançadas nessa trajetória rumo às liberdades civis na Inglaterra foi a proclamação da Petition of Rights, documento constitucional inglês no qual se encontra patrocinada a proibição imposta ao monarca de violar liberdades e direitos essenciais dos súbditos (KAMRUZZAMAN & KANTO DAS, 2016, 3, n.º 2, 8).

    O rei Carlos I sucedeu ao seu pai, o rei James I, no ano de 1625, logo após a morte deste último. Ambos acreditavam que os monarcas eram escolhidos por Deus e, como tal, eram munidos de um poder divino, contra o qual ninguém podia ir, sob pena de estar a atentar diretamente contra Deus. Imbuído deste espírito, o rei Carlos I pretendia governar de forma autocrática, isto é, sem a aprovação e oposição de ninguém, sendo absoluto tudo o que o mesmo dissesse e/ou dissesse. Carlos I pretendia, assim, suprir o sistema de governo parlamentarista inglês, pela instauração de uma monarquia absolutista na Inglaterra do século XVII, pelo que investiu na exoneração do poder aos nobres e plebeus ingleses. No sistema parlamentarista, pese embora o rei concentrasse na sua figura bastantes poderes, o seu governo era escrutinado pelo Parlamento, constituído pela House of Lords (Nobres) e pela House of Commons (Representantes Eleitos), o qual concedia/aprovava, ou não, determinadas autorizações para ações que o rei pretendia executar, tais como a cobrança de impostos.

    O reinado de Carlos I foi caracterizado por vários desafios financeiros, disputas religiosas e pela pretensiosa tentativa de reinar sem necessidade de supervisão do Parlamento e a sua regular convocação.

    A Europa Ocidental foi palco da Guerra dos Trinta Anos, que decorreu deste 1618 a 1648, germinada pelas acirradas rivalidades entre católicos e protestantes. Durante tal conflito, as disputas entre o Parlamento Inglês e o rei Carlos I foram-se, igualmente, agudizando, levando o Parlamento a recusar a concessão de subsídios para continuar a financiar aquela longa conflagração (KAMRUZZAMAN & DAS, 2016, 3, n.º 2, 8). O limiar da discórdia entre o Parlamento e o rei Carlos I surge quando aquele decide entrar em guerra com a Espanha, com o propósito de exibir o poder da Inglaterra. Os ataques à Espanha foram arquitetados com o auxílio do duque de Buckingham, mas resultaram completamente malogrados e muito dispendiosos.

    Não obstante os insucessos da guerra, o rei Carlos I continuava a insistir nas suas investidas beligerantes e, face à deliberada recusa de financiamento por parte do Parlamento, o rei Carlos I encetou um movimento de financiamento forçado, à revelia do Parlamento, coagindo os nobres a fazerem empréstimos à Coroa, vendendo as suas propriedades, restabelecendo impostos antigos e impondo a aplicação de taxas sobre a caça, entre outros. Carlos I ordenou ainda a prisão arbitrária de todos aqueles que se negassem a emprestar o dinheiro à Coroa para a manutenção da guerra (KAMRUZZAMAN & DAS, 2016, 3, n.º 2, 8) e aplicou a lei marcial em tempo de paz e a julgamentos de civis. A par disso, em face do estado de guerra do país, o rei Carlos I ordenou ainda que os soldados e marinheiros fossem acolhidos e alimentados nas casas da população civil inglesa (KAMRUZZAMAN & DAS, 2016, 3, n.º 2, 8).

    O que se via a acontecer era a gradação do poder do monarca e o exacerbar da sua tendência absolutista. Assustados com tal cenário económico e político e com a iminente perda do poder do Parlamento, este começou a desenvolver esforços para travar o avanço destas adversidades.

    Cinco dias após a reunião do terceiro Parlamento de Carlos I, a 17 de março de 1628, os membros do Parlamento, sob o comando de Sir Thomas Wentworth, desencadearam a força de ataque aos abusos do rei, violadores dos direitos e liberdades dos súbditos, agrupando as suas reivindicações em quatro categorias essenciais, a saber (HULME, 1935, 302):  

    – O Rei não podia angariar fundos através de impostos ou empréstimos sem a prévia aprovação do Parlamento;

    – Ninguém podia ser preso sem motivo ou sem um julgamento justo;

    – Fim da obrigação de os civis alojarem soldados e marinheiros;

    – Proibição da aplicação da Lei Marshall em tempo de paz.

    Portanto, como condição prévia à concessão de qualquer cobrança de impostos futuros, o Parlamento, a 6 de maio de 1628, compeliu o rei Carlos I a aceitar a Petition of Right, reforçando a ideia de que o Monarca estava sujeito à Lei e que a sua autoridade não podia ser exercida arbitrariamente. O rei Carlos I assinou, pois, a Petition of Right, a 7 de junho de 1628, ainda que sob protesto. Todavia, para evitar que mais e novas restrições fossem impostas à Coroa, o rei Carlos I não tornou a convocar o Parlamento em assembleia durante os onze anos seguintes.

    O Parlamento inglês foi dissolvido em 1629. Por essa altura, Henry Elsying, escrivão do Parlamento, recolheu todas anotações que foi recolhendo durante as sessões, bem como seus registos diários, e ainda converteu tudo num relatório final (FOSTER, 1974, 81). Pelas mãos de Henry Elsying foram narrados todos os marcantes eventos do desenvolvimento da Petition of Right, constituindo a base da própria impressão deste documento histórico, o qual, de forma inovadora, foi impresso em moldes de Estatuto (FOSTER, 1974, 81).

    Em suma, a aceitação da Petition of Right pelo monarca Carlos I assumiu-se como um marco crucial na história constitucional britânica e um evidente e significativo avanço na proteção dos direitos individuais contra o despotismo monárquico.

    No contexto além-fronteiras britânicas, este ato legislativo teve implicações jurídicas deveras importantes e duradouras, estabelecendo a base para futuros documentos e estatutos no âmbito dos direitos, liberdades e garantias individuais, tais como o Habeas Corpus Act 1679, a Bill of Rights 1689 e a United States Bill of Rights (que entrou em vigor nos Estados Unidos da América em 15 de fevereiro de 1791).

    Bibliografia

    FOSTER, E. R. (1974). “Printing the Petition of Right”. Huntington, Library Quarterly, 38 (1), 81-83,  https://www.jstor.org/stable/3817049 (acedido a 07.02.2024).

    FOSTER, E. R. (1974). “Petitions and the Petition of Right”. Journal of British Studies, 14 (1), 21-45,  https://www.cambridge.org/core/journals/journal-of-britishstudies/article/abs/petitions-and-the-petition-of-right/E57F436AF665366141BEF75671982FC1 (acedido a 07.02.2024).

    HULME, H. (1935). “Opinion in the House of Commons on the Proposal for a Petition of Right, 6 May, 1628”. The English Historical Review, 50 (198), 302-306,  http://www.jstor.org/stable/552987 (acedido a 07.02.2024).

    JERÓNIMO, P. (2015). Lições de Direito Comparado. Braga: ELSA UMINHO.

    KAMRUZZAMAN, Md. & KANTO DAS, S. (2016). “The Evolution of Human Rights: An Overview in Historical Perspective”. American Journal of Service Science and Management, 3 (2), 5-12, file:///Users/ameliamesquita/Downloads/7100190.pdf (acedido a 07.02.2024).

    Autora: Amélia Mesquita

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